Sobre
a chuva
Coleciono
o orvalho nos meus olhos. Lava o pátio e o porão, como se depois, tudo pudesse
ser de novo e é bem certo que seja uma temporada passageira; e algumas vezes
até mesmo inconveniente, chove torrencialmente e eu espiando através da
janela contendo a alma com vontade de se encharcar!
Sobre
o frio e os dias de sol
Não
me deixa alvorecer, cheiro cortante de inverno invadindo as narinas, uma visita
ao meu inferno particular, frio e úmido. Raspo com as pálpebras as gotas que
ficam presas nas paredes, no céu, nas nuvens, nas beiras, no bafejo das nuvens
cinzas.
Confesso,
não é o sol que quero na pele, senão, o calor do teu olhar.
Faço
sempre outono no meu quintal, arremesso as folhas com teu nome rabiscadas ao
vento, despetalo as flores buscando o teu bem querer.
Faço
a primavera na minha pele sentindo a alma trêmula com desejo de ficar
encharcada de nós.
Sobre
o tempo
Escavo com as unhas a espádua íngreme do tempo como
sobrevivente de uma avalanche. Ergo as anáguas como se fosse o verão rendendo
suas últimas flores ao outono.
Inverno,
depois de usar a lâmina de descascar esquecimentos em todas as fantasias.
Ah
esta mania de remendar odes como se fosse chegar ao final de todos os tempos, travando
esta muda comunicação entre o coração e a razão, artifícios em vão.
Sobre
todas as coisas
Aqueço
nuvens quantas vezes os meus olhos desejarem se banhar. Chovo desafiando a
noite, o tempo, as coisas que foram, as que virão...
Só
porque aprendi que regar o nosso amor ao luar é nunca estar sozinha.
Santa
e inquisitória saudade!
És
tu a lama que me reveste, depositário que minh’alma elegeu habitar...
Te
amarei até o fim dos meus dias e isso, de verdade, não é uma promessa!