As pontas dos dedos passearam por entre as pérolas, contornado uma a uma, desistiu de conta-las. Afinal, do que serviria saber a quantidade? Bastava-lhe ser adornada por lembranças, cicatrizes de sofrimento das ostras e neste momento isso lhe caía bem. Pela última vez, deitou-as sobre a pele nua, no vale entre o pescoço e o colo; espaço quente, que reagiu como savana ao vento no fim de tarde, fora percorrida por prazeroso arrepio ao momento do primeiro roçar.
As pálpebras cerraram-se junto aos seus sentimentos, resguardando o recato das retinas que se banhavam, nuas, em lágrimas mornas; pareciam-lhe escorrer em sentindo invertido, inundando suas cavernas de lembranças, num demorado e sufocante afogamento, sortidos ecos que se consumavam em soluços.
Também não contou o tempo até seu último suspiro. Privada d’aquele sopro que a mantinha viva, já não importava respirar, viveria doravante de um ar de lembranças.
E foi no balcão sobre os rochedos - testemunho de toda a fúria do mar, que arrancando de um golpe só, fê-las saltar, cintilantes como estrelas perdidas no céu - devolveu-as ao mar.
Já não havia mais motivos para adornar-se, que a fúria do mar as consumisse, com a mesma destreza que a fúria da ingratidão a consumia.
Mira-se no espelho agora, com um gélido olhar e o único sinal de vida que se percebe, é o vinco avermelhado que ficou...rasto de uma última homenagem...
*[Escrito em fev/2011]
2 comentários:
'As pálpebras cerraram-se junto aos seus sentimentos, resguardando o recato das retinas que se banhavam, nuas, em lágrimas mornas;' Emocionante te ler! Um brinde a sua elegancia poética que rasga o verbo a flor da pele. Muito lindo seu espaço, cada coisa que leio, exulto. Abraços, V.
PS: Só consegui postar como anônimo, foram várias tentativas
Oi Amigo,
Obrigada pelo comentário, mas não exagera né...rs
Mudei o formato dos recados, mas mesmo assim, algumas pessoas encontram problemas. Mas é isso, sei que voces me visitam e só tenho que agradecer essa atenção toda.
Bjs nas meninas
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