É fato que o exílio almejado fora concedido.
É fato que a vida se invertia nas horas entornadas pela insônia noturna.
Esforçava-se para calibrar os olhos, à luz do dia, que insistia em penetrar sua noite.
Sustentando o corpo na sombra da parede, como prédio urbano que se escora no cinza da cidade, não surte efeito de cafeína - o arremedo de sorriso que endereça ao espelho do banheiro que lhe espreita, num ângulo diagonal.
Despe-se de todas as fantasias para mergulhar na boca escancarada do chuveiro. Uma algazarra de piranhas famintas, com promessas de arrancar-lhe toda a pele dos ossos.
Sobrevive. Acordando os poros entupidos de solidão, com as lambidas do felpo da toalha ressaqueada e sem sentimento.
Deixa que o armário lhe cuspa um uniforme de retirante e o espelho lhe vire às costas, negando-lhe a imagem preterida.
Amarra os cadarços, como se estivesse ancorando a jangada esbulhada de um náufrago que retorna, sem já ser mais esperado.
Para onde vamos?
Pergunta-lhe a alma que balança no beiral do telhado do dia.
A tarde já estava indo longe, deixando uma saliva morna e melancólica, como lenha crepitando em lareira preguiçosa, um ínfimo traço de emoção. Oferendas ao inverno, o único que não lhe abandona.
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